quinta-feira, agosto 10, 2006

O café e a Elis me enganaram. Agora vou ouvir Maria Rita e tomar chá.

Porque você gostava da Elis como a minha mãe gosta e gostava de café como o meu pai gosta. Só me pergunto – atualmente – qual era o motivo, se era real ou se delírio. Acho que comecei a te amar – ainda que eu procure pessoas e não fantasias – neste fato, ainda que eu o negue sempre, sempre, sempre.
Digo que é a força, a tua aparente força, que me fez amá-lo;
Mas não, de verdade?
Ah, não, de verdade é a confissão da fraqueza, – dizem: as mulheres amam a fraqueza dos fortes. A confissão da fraqueza dos fortes. Acho que comigo é assim também.
Mas voltemos a Elis e ao café. Porque naquele dia – o segundo dia – você falava que, se ela perdesse a voz, deveria morrer. Eu o amei incomparavelmente porque vi nas tuas palavras a reflexão de um espelho das idéias das quais eu acreditava. Porém, pensando agora, torpe ingenuidade a sua, porque – creio eu – a própria já sabia disso, já antevia o futuro, tanto que o procurou. A morte não é a preocupação porque – tolo você –, morte não existe, existe passagem. (Não pense que estou mais crédula do que já sou, não é isso exatamente).
O fato, sempre o fato: De nada adianta a constatação ou o desejo ou a vontade ou a gana sem o porquê de tudo isso acima descrito, o motivo é o principal de cada fato em particular. Acaso a morte seja encarada como revolta, como luta de uma não impossibilidade qualquer da arte, ainda vá lá; acaso a morte seja o mero e desinquieto capricho de um fã que nem sequer vê que a grandiosidade da arte também está nas fraquezas humanas de todo artista, isso não. E eu que confundi as coisas, que pensei docilmente na segunda possibilidade de compreensão das suas palavras.
Enfim, ao café. Acho que quero parar de tomar, sei lá, acho que quero realmente parar. Vou pensar nisso sistematicamente esse próximo mês. Acho que você também deveria pensa-lo. Afinal, o motivo.
Queria saber porque a gente está sempre inventando espelhos para nossas angústias tão particulares e negando – súbita ou paulatinamente – a essência dos outros.
Acho que olhando o mar eu consigo ver outros espelhos mais, digamos, físicos; quero entrar nos espelhos, esquecer da minha própria pessoa para me achar porque já cansei dos espelhos invisíveis que carrego dentro das minhas malas, está muito pesado, ando cansada, então, vamos fazer o seguinte: não sou saudosista, por hora, enquanto a gente não decidi quem fica com o quê, deixo tudo pra você, sou mais leve, vou ouvir Maria Rita e tomar chá.